Artigo | A Pior Estratégia de Transformação Digital Que Existe
A transformação digital e sua evolução
A transformação digital se tornou um termo genérico utilizado em diversos contextos para explicar os últimos movimentos do mercado para alcançar os seus objetivos em um ambiente de expansão de canais digitais. Porém, de forma mais simples e prática na Moving abordamos a definição de Transformação Digital como o impacto da tecnologia no ambiente de negócios. É claro que esse impacto pode ser gerado por diversos ângulos e construídos sob múltiplos aspectos, mas em linhas gerais se observamos algum impacto tecnológico nos modelos de negócios podemos afirmar que é a transformação digital em ação.
Na década de 80 foi possível perceber esse impacto com o nascimento das ferramentas de registro de texto e números, na década de 90 a intensa curva de adoção das ferramentas ERP. Nessa linha do tempo também se observou o crescimento exponencial do alcance à internet com suas subsequentes evoluções com o 3G, 4G e agora 5G. Isso proporcionou um aumento imensurável de novos formas de acesso a clientes, agora digitais. Essa história foi marcada pelo nascimento de canais que representaram verdadeiras viradas nos modelos de negócios já existentes. O Google como canal de busca, o Facebook como canal de relacionamento, a Amazon como canal de transações, o subsequente movimento de “Uberização” das plataformas, acompanhando da “Uberização 2.0” oriundo da escola canadense, etc.
Todo esse contexto deixa claro que a transformação digital já não é novidade há muito tempo. Então, é fácil afirmar que a partir da intensificação dos canais digitais inúmeras estratégias e caminhos já forma testados, com sucesso ou não, mas já foram executados e principalmente, com grandes aprendizados.
Ter acesso a esses aprendizados não é uma tarefa fácil, afinal não são informações públicas. Poucas são aquelas que transformam as experiências das suas jornadas de transformação em estudos de caso ou algum outro formato que possibilite a socialização dessa informação.
As consultorias
Nesse contexto a indústria das Consultorias exerce uma função muito importante, pois o principal papel delas é guiar empresas pela construção de seus próprios caminhos. Porém, livrando-as nesse trabalho das avenidas de fracasso já experimentadas por seus casos ou clientes anteriores. Elas possuem um vasto banco de casos, caminhos, frameworks, etc. Grande parte deles de sucesso, porém, em algum lugar muito bem registrado e seguro aqueles que representaram um fracasso, mas isso com os principais aprendizados, que se compartilhados podem facilitar significativamente essa jornada e evitar dores já vivenciadas.
Consciente dessas informações, seria muito simples partir para a contração de uma empresa como essa para desenhar, implementar e acompanhar a transformação digital ao momento que se decidisse viver essa jornada. Porém, existem alguns motivos que fazem essa contratação nem sempre ser a melhor ou até mesmo uma opção, dentre eles o valor milionário que esse trabalho custa às organizações.
Essa limitação é um dos principais fatores que faz surgir grande parte dos modelos de transformação mais disfuncionais que o mercado já concebeu. Alguns deles propõem uma estratégia extremamente ousada, muito além da maturidade que a empresa possui para executar. Outros não tão ousados assim, com centro grau de equilíbrio entre a experimentação e adoção de riscos orçamentários e operacionais. Existem modelos extremamente conservadores e por consequência mais lentos. Alguns transferem a execução ou a operação para parceiros especializados, enfim, existe uma infinidade de modelos. Porém, o maior perigo desse caminho é quando a empresa observa o valor de uma proposta como essa e decide parti-la verticalmente.
Partir verticalmente remete a uma discussão sobre os termos Slicing Vertical x Slicing Horizontal. Isso é algo profundamente debatido (ou deveria) em equipes ágeis que compõem a camada de execução de um modelo operacional ágil. Os famosos Squads. Porém, os motivos que fazem esse conceito ser pauta importante de um modelo operacional ágil é o mesmo que deveria fazer parte das discussões na camada executiva ou da liderança sênior das organizações, sobretudo quando se discute qual caminho seguir para uma jornada de transformação digital.
O ponto é que ao invés de buscar um contrato com a Consultoria que busque a implementação e acompanhamento, além do desenho estratégico, os CEOs e VPs caem no erro de observar a proposta e fazem o abominável Slicing vertical. Realizam a contratação apenas do apoio para a decisão estratégica de qual modelo de transformação seguir e qual desenho organizacional deveria suportar essa estratégia e fazem isso observando a empresa como um todo.
O termo “apenas” utilizado para fazer menção a essa contratação não quer dizer que esse trabalho seja pequeno ou pouco importante, mas se feito de forma isolada, dificilmente vai alcançar os resultados projetados. Nesse caso, se recomenda também em camadas executivas a visão do Slicing horizontal. Ele sempre promoverá que o menor pedaço de uma solução seja executada de ponta a ponta para que exista a comprovação da captura de valor antes da escala.
Sendo assim, ao partir do principio de que não haja recursos financeiros suficientes para uma contratação que torne a Consultoria responsável por todo desenho, implementação e acompanhamento, é mais estratégico que essa negociação busque:
- Identificar qual recorte da empresa está mais propícia para viver essa jornada. A própria consultoria pode auxiliar nessa definição.
- Contratar a Consultoria para desenhar, implementar e acompanhar essa estrutura por um ou dois trimestres, tempo suficiente para que já seja possível mensurar a captura de valor promovida pelo novo desenho.
- Avaliar a necessidade de seguir com o apoio da consultoria na adaptação e escalada por toda empresa do modelo experimentado.
Esse caminho será mais saudável do que desenhar com os consultores uma estratégia encantadora, mas não será de factível execução, seja pela ausência de pessoas com conhecimento, por ser uma estratégia desconectada da realidade ou por algum outro motivo não capturado por um desenho criado sem o compromisso de execução. Afinal, “Ideias são fáceis, execução é tudo”.
A expectativa e a realidade
Esse tema poderia ser um grande capitulo a parte, pois além dos riscos citados no paragrafo anterior, existe um outro fator comum percebido entre CEOs que acabaram escolhendo esse caminho. Ele se refere a dificuldade de separar com clareza o desejo de onde gostaria que a sua empresa estivesse em relação ao momento que realmente está. Ou seja, ao construir a estratégia e desenho do modelo de transformação, acabam partindo de um cenário que representa do grau de maturidade que eles gostariam que as empresas estivessem. Nesse caso o grau de maturidade mencionado trata de diversos aspectos, como por exemplo de gestão de pessoas, processo orçamentário, senso de propósito, deck cultural, etc. O fato é ao decidir que caminho seguir a maior parte deles acabam tomando essa decisão baseados num cenário que não condiz com a realidade da empresa o que torna inexecutável a implementação daquilo que foi desenhado.
O resultado é que no momento em que a Consultoria entrega o seu Bluebook da transformação e se retira, as equipes que recebem a tarefa de executar a estratégia desenhada acabam enfrentando desafios, barreiras e riscos que o desenho não previu e acabam diante de um beco sem saída.
A estratégia não executada
A grande reflexão que esse texto propões é relacionado a não execução da estratégia desenhada. A discussão proposta não é uma busca por tecer críticas aos desenhos, estratégias e modelos construídos pelas consultorias. É exatamente o contrário, eles são fundamentáveis e deveriam ser tratados como requisitos para o início de uma jornada de transformação. Principalmente quando vem acompanhados de aprendizados de outras empresas da mesma indústria. O que é necessário garantir e a liderança sênior das empresas possuem um papel crucial nisso é que as estratégias desenhadas sejam executáveis.
O questionamento principal que esse texto propõe é sobre “Qual a pior estratégia de transformação digital do mundo?” A reposta é também é bem simples e prática. A estratégia não executada! Independente de qual seja, ela precisa ser executada, experimenta antes de ser adaptada.
Essa falha não se restringe ao trabalho das consultorias. O grande número de contratações que se limitam ao desenho estratégico faz com que infelizmente seja muito comum que esse trabalho seja colocado nas gavetas do escritório. Outro cenário ainda pior é que no fim a sua execução seja seletiva. Isso quer dizer que só se executam as partes que não representam uma dor ou esforço. Um possível caminho é que ao se executada essa estratégia seja adaptada ao ponto de representar um caminho completamente diferente do pactuado com a liderança, promovendo um enorme desalinhamento de expectativas.
Outros caminhos possíveis
De toda forma, mesmo que as consultorias sejam uma excelente forma de acesso aos aprendizados providos por outras empresas, elas não representam o único caminho para transformação. Existem muitas que decidiram viver suas jornadas autônomas, desenhando seus próprios modelos e caminhos e fazendo uso da experimentação para avançar, aprender e adaptar.
Algo relevante para as empresas que decidem viver a sua transformação por esse caminho é ser conscientes que precisarão contratar talentos do mercado que já tenham experimentado outras jornadas de transformação. Esse conhecimento será essencial para construção de cada um dos seus passos.
Para isso, o primeiro parceiro que a empresa precisa ter antes mesmo de começar a sua transformação é a sua própria área de RH ou de Gente como algumas organizações preferem nomear. Essa área precisa compreender a sua relevância antes de qualquer passo rumo a transformação. Ter os talentos necessários para viver uma transformação quer dizer que é preciso construir um profundo programa de atração e retenção de talentos, que passa pelo redesenho das linhas de carreiras para posições digitais, compreensão dos novos perfis, características, comportamentos, valores, etc.
Fazer com que todo esse pacote seja percebido pelo mercado, lembrando que ele passa construção de um deck cultural conectado a essas características garantindo que ele não seja apenas um documento colorido, afinal, o mais importante é que ele seja vivido e percebido no comportamento dos lideres.
Um ultimo ponto importante e que em geral representa uma grande dor para os VPs de RH é que para ter os melhores talentos, também é preciso ter melhores propostas. O que vai demandar uma mudança na orientação orçamentária da área, deixando de ser mais orientada a custos para ser orientada por potencial captura de valor. Com isso, ao atrair os primeiros talentos ela começará a se preparar para viver a sua transformação e se aprofundar em temas como esse, o processo orçamentário de organizações digitais com modelos operacionais ágeis. Ser consciente desses possíveis caminhos é um bom ponto de partida para que líderes de grandes organizações guiem suas equipes por uma jornada de transformação. Principalmente saber que a estratégia de transformação precisa ser desenhada considerando a maturidade real da empresa para que ela seja executável. Se for contar com uma Consultoria nesse trabalho, ser consciente do Slicing horizontal do contrato e ao definir a estratégica considerando os dois itens anterior, ser um agente apoiador ou garantidor que essa estratégia seja executada e gere seus aprendizados antes de ser adaptada. Por fim, garantindo também que exista um alinhamento de expectativas entre a camada executiva e de execução sobre os caminhos, dificuldades e resultados esperados.
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